Denunciada por corrupção em 2010, Delta continuou a fechar contratos com governos
André de Souza
Após ser apontada como líder de um esquema de corrupção que desviou milhões de reais dos cofres da União e veio a público em agosto de 2010 - na Operação Mão Dupla, feita pela Controladoria-Geral da União (CGU) com a Polícia Federal (PF) - a construtora Delta continuou assinando contratos de alto valor com órgãos federais. Desde que o governo tomou conhecimento das graves irregularidades cometidas pela empreiteira em obras de rodovias no Ceará, foram assinados 31 novos contratos com o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), no valor total
de R$ 758 milhões.
A Operação Mão Dupla identificou fraudes em licitações, superfaturamento, desvio de verbas, pagamentos de propina, pagamentos indevidos e uso de material de qualidade inferior ao contratado em obras de infraestrutura rodoviária sob o comando do Dnit feitas pela Delta e outras 11 empreiteiras. A investigação resultou na prisão do então superintendente do Dnit no Ceará, Joaquim Guedes Martins Neto, que, segundo a CGU, tinha, em 2008, "rendimento incompatível com a renda auferida pelo agente público", e do diretor da Delta Aluízio Alves de Souza.
Na época, a CGU informou que detectara "um prejuízo estimado em R$ 5 milhões aos cofres públicos da União, afora o risco social decorrente da execução de obras de infraestrutura rodoviária fora das devidas especificações técnicas". No sábado, o ministro da CGU, Jorge Hage, reconheceu que as irregularidades apontadas pela Mão Dupla são graves. Mas isso não impediu que o Dnit celebrasse novos contratos com a Delta, sendo três deles (no valor total de R$ 9,6 milhões) no Ceará, onde foram detectadas as irregularidades em 2010. Trata-se da conservação e da recuperação de trechos das BRs 116, 437 e 230.
Os contratos firmados desde agosto de 2010 são para construção, duplicação, adequação ou manutenção de 19 rodovias em 17 estados. Além disso, em setembro de 2010, através de consórcio com outras duas empresas, a Delta conseguiu fechar com a estatal Valec um contrato de R$ 574,5 milhões para tocar as obras do lote um da Ferrovia Oeste-Leste, na Bahia. O Dnit e a Valec são ligados ao Ministério dos Transportes.
A empreiteira ganhou destaque recentemente no noticiário por suas ligações com o bicheiro Carlinhos Cachoeira, preso pela PF em fevereiro na Operação Monte Carlo. Hoje, a CGU promete abrir processo administrativo contra a Delta.
O resultado dessa investigação poderá tornar a empresa inidônea, o que implica a proibição para firmar novos contratos com o governo federal.
Além do Ceará, foram assinados contratos entre o Dnit e a Delta para obras em Alagoas, Amazonas, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rondônia, Sergipe e Tocantins. Dos 31 contratos, apenas um, de R$ 115 milhões, em Goiás, foi paralisado. Desse valor, o Dnit já pagou R$ 8,8 milhões à Delta.
Vinte e cinco contratos, no valor de R$ 611,7 milhões, constam como ativos. Outros três foram cadastrados no início de 2012 e totalizam R$ 13,6 milhões, mas as obras ainda não começaram. Dois contratos, no valor de R$ 17,8 milhões, já foram concluídos. Desse montante, R$ 15,6 milhões foram pagos à construtora, segundo o próprio Dnit. Em agosto de 2010, na Operação Mão Dupla, a PF cumpriu 52 mandados de busca e apreensão, 23 de prisão temporária e um de prisão preventiva. Houve ainda o afastamento cautelar de oito servidores públicos e sequestro de bens em
Fortaleza e no interior do Ceará. A CGU analisou oito contratos e detectou irregularidades em sete, referentes a quatro obras, dentre as quais duas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Uma delas é a duplicação de uma ponte na BR-304, sobre o Rio Jaguaribe, no município de Aracati, orçada em R$ 30 milhões. A obra foi iniciada pela Delta em 2002 e, por sete anos, as fundações permaneceram de molho nas águas do rio, enquanto a travessia era feita pela ponte velha. A Delta, que desistiu de construir a ponte, alegou
"elevação dos custos que dificultaram a realização do projeto inicial previsto no edital". Segundo Hage, o processo administrativo disciplinar contra o então superintendente regional do Dnit no Ceará e outros seis servidores pode resultar
em demissão. Na última sexta-feira, o Ministério Público Federal propôs ação penal contra os servidores do Dnit no Ceará e contra a Delta por formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, corrupção passiva e ativa com base nos resultados da Operação Mão Dupla. Procurado para manifestar-se sobre a assinatura dos contratos, o Dnit informou, por meio da assessoria, que vai esperar a decisão da Justiça e da CGU para tomar medidas em relação à Delta. "A empresa não é considerada inidônea ainda", destacou a assessoria.
O grande número de contratos com órgãos públicos obtidos pela Delta se refletem em seu faturamento. Dados da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) mostram que até 100% dos ganhos da construtora vêm de contratos com o setor público. Entre as seis maiores empreiteiras do Brasil, a Delta é a única que se dedica quase exclusivamente à construção de pontes, viadutos, estradas, túneis, aeroportos e projetos de saneamento. A construtora teria realizado obras para a iniciativa privada nos anos de 2007, 2008 e 2011, mas manteve um percentual acima de 97% de projetos destinados a prefeituras, estados e União. Os maiores percentuais de crescimento da Delta ocorreram em 2006/2007 (67%) e em 2009/2010 (51%).
COLABORARAM: Fábio Vasconcellos e Renato Onofre
Delta participa de quatro grandes obras para a Copa
Contratos para cinco obras do PAC somam R$ 1,3 bilhão; a maior participação é na Ferrovia Oeste-Leste
Mônica Tavares
Agência A Tarde
Além da construção do Maracanã, a construtora Delta participa de três outras obras fundamentais dentro dos preparativos para a Copa do Mundo, com contratos que somam R$ 1,198 bilhão. São obras de mobilidade urbana no Rio, Belo Horizonte e Fortaleza. A construtora também está presente em cinco grandes obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em contratos que somam R$ 1,363 bilhão.
No Rio, a empreiteira é responsável pela implantação da Transcarioca, que ligará o Aeroporto Internacional Tom Jobim à Barra da Tijuca passando pela Penha. Feito em consórcio com a Andrade Gutierrez, o contrato soma R$ 798 milhões. Apesar dos crescentes rumores de que abandonaria a obra, a Delta não confirma a informação. Em nota divulgada ontem, a prefeitura do Rio deixou claro que o contrato prevê uma alternativa:
"O contrato assinado com o município estabelece que, se uma das empresas decidir sair, a outra - neste caso, a Andrade Gutierrez - assume todas as responsabilidades pela obra, sem causar qualquer prejuízo à cidade." A prefeitura ressalta, no entanto, não ter sido informada de qualquer decisão da Delta sobre abandonar a obra.
Em Belo Horizonte, uma das obras importantes para os jogos de 2014 está sendo executada pela Delta. Trata-se da ligação do aeroporto de Confins à região hoteleira e ao centro da capital, com a implantação do BRT (Trânsito Rápido de Ônibus). Em consórcio com a Construtora Cowan, a empreiteira foi contratada pela prefeitura do município para realizar a parte principal da obra. O contrato, no valor de R$ 170 milhões, começou a vigorar em março de 2011 e vai até abril do próximo ano.
Enquanto as obras no Rio e em Belo Horizonte já andam a pleno vapor, as de Fortaleza sequer começaram.
Prevista para ter início em duas semanas, a construção da Via Expressa em Fortaleza, com túneis e viadutos, deve render R$ 145 milhões à Delta.
Além das obras da Copa, a Delta está presente em grandes obras do PAC. Entre essas, a maior participação é na Ferrovia Oeste-Leste dentro do Consórcio com a SPA Engenharia e Convap, com contrato de R$ 574 milhões. A ferrovia terá 1.527 km de extensão e fará uma conexão com a Ferrovia Norte-Sul.
A segunda maior participação é na obra de Transposição do Rio São Francisco - em consórcio com a EIT e Getec - valor de R$ 265 milhões. A transposição é uma obra bastante polêmica, que começou em 2007 e desvia as águas do rio São Francisco em Pernambuco para a Bahia, Rio Grande do Norte, Bahia e Ceará.
Além disso, a Delta tem participação na duplicação da rodovia BR-060, em Goiás e em dois lotes da BR-101 em Sergipe, que tem 204 km de extensão. A BR-101 é a segunda maior rodovia do país, com quase 4.200 km cortando todo o litoral.
A empresa também tem contratos de manutenção e e conservação de rodovias em todo o país. Somente em janeiro e fevereiro deste ano foram assinados três novos contratos, sendo dois para trabalhos no Ceará, nas BR-116 e BR-437 e outro no Paraná na BR-158, no total de R$ 7,8 milhões.
O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) informou que aguarda a decisão da CGU sobre a idoneidade da construtora para posicionar-se a respeito da participação da construtora nessas obras.
A Delta informou ontem que vai tentar manter-se nas obras do PAC. Em nota, afirma que "tem feito um enorme esforço para seguir com todos os projetos que toca, honrar todos os compromissos, manter todos os postos de trabalho de seus mais de 25.000 colaboradores, cumprir todos os prazos de entrega das obras contratadas, ao mesmo tempo em que se defende na Justiça, na mídia e no Parlamento".
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