“O dinheiro é para o crime o que o sangue é para a veia.“
(Ministra Cármen Lúcia, do STF, no julgamento da Ação Penal 470)
Democracia só se aperfeiçoa com a prática. Justiça só será eficiente quando atingir a todos, indistintamente. O Estado Democrático de Direito, conquista da modernidade, vive, entre nós, ainda, um incipiente processo de maturação.
Por séculos, embora gritasse nas entranhas da alma popular uma imensa sede de justiça, os poderosos, empregando a força bruta, calcada nas riquezas usurpadas, subvertiam a ordem natural e impunham a submissão do mais fraco. Do direito da força a sociedade migrou para sistemas que consagraram o poder dos mais astutos, dos que desenvolveram a inteligência, mas não o senso moral. Guardava-se, quando muito, a aparência do direito, mas vivia-se distante da verdadeira justiça. A política, em nosso meio, ainda vive sob o estigma dessa fase. Dela herdou a preservação de odiosos privilégios, engendrados em formalismos aparentemente legais, mas feitos com o intuito de burlar a justiça. Ao lado de homens probos que buscam na política formas de realização do bem comum, outros, os maus políticos, violam despudoradamente a lei apostando na impunidade. Abrigam-se, muitas vezes no generoso regaço do próprio sistema legal, ainda imperfeito.
Mesmo que se reconheçam, nos dias que correm, fortes ações em prol da moralidade pública, o direito e a justiça ainda são gravemente violados por muitos daqueles que juraram defendê-los. Por trás disso, está sempre a ambição, expressão mais forte do egoísmo e do exacerbado materialismo. Nesse cenário, é gratificante se ver em curso um processo voltado a produzir radicais transformações. Quem sabe, estamos no limiar de uma nova fase da história institucional do país. Diferentemente do desejável, essa etapa não nos chega, ainda, pela rejeição, via voto eleitoral, de políticos indignos de seus cargos. A democracia ainda incipiente, aliada à deformação moral - por que não? – de considerável parcela do próprio eleitorado, nos obriga a conviver com políticos corruptos ou corrompidos pela ação nefasta de setores econômicos comprometidos com a criminalidade. As transformações sonhadas por homens e mulheres de bem, estão chegando, ao que parece, pela ação decisiva da própria Justiça, agora melhor aparelhada para punir atos de corrupção.
No momento em que é escrito o presente editorial, embora ainda distante de uma decisão final, o Supremo Tribunal Federal sinaliza pela aplicação de severas condenações, senão à totalidade, à maioria dos envolvidos no episódio de monumentais desvios de recursos públicos que passou a ser conhecido como “mensalão”. Essas sinalizações enchem de esperanças o povo brasileiro, autorizando, desde já, a interpretação de que o exercício da política, em nosso país, terá, nesse episódio, um divisor de águas. Nossa história política se dividirá entre antes e depois do “mensalão”.
Concomitantemente, realizam-se, neste mês de outubro, no Brasil inteiro, eleições para os cargos executivos e legislativos municipais. É a vez de o povo julgar diretamente os pretendentes ao exercício de cargos públicos no âmbito de suas comunidades. Exercido que for esse direito com critérios verdadeiramente republicanos, estaremos, preventivamente, pondo nossos municípios a salvo da corrupção e das más administrações. É a democracia promovendo a justiça antecipada. Só essa estreita comunhão entre povo e estado, ancorados todos em valores autenticamente éticos, garantirá a construção de uma sociedade verdadeiramente justa e feliz.
Nossa história política se dividirá entre antes e depois do “mensalão”.
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